Quando eu pensei em criar um projeto de fim de ano, inicialmente, a ideia era incentivar as pessoas a mudarem de perspectiva. Sobre inglês e também sobre os próprios processos, rotina e sonhos. Ambiciosa, eu.

Mas a verdade é que com o fim do ano vem também o Natal e quando um aluno me pergunta, despretensioso lá pelo Instagram, o que eu desejaria de presente para o mundo e eu respondo “amor”… é impossível não começar a conectar algumas coisas. Eu dificilmente responderia isso antes. Duvido até que pensaria nisso como um desejo ou solução pro MUNDO, pra ser sincera. Mó ideia utópica da porra, né? Abstrata. Mas há anos já estou num caminho muito particular entendendo amor de um jeito novo e, com o passar do tempo, tá cada vez mais fácil perceber as coisas conforme acontecem. Pois.

Todas as aulas ao longo de dezembro começam às 06:07. Tenho levantado todos os dias às 05:05, por nenhum motivo em especial a não ser me arrumar, comer e levar o bicho para passear antes de entrar ao vivo. E dois dias atrás eu simplesmente não consegui dormir a noite. Preocupada, triste, ansiosa sem saber a razão, tal. Quando tocou o despertador do meu horário de levantar, eu já estava tomando café e o Calvin pronto para sair.

Sempre coloco música nos fones e, enquanto espero pelo elevador com o bicho, surpreendentemente espero também pelo inevitável ar fresco e mais gelado das cinco da manhã… é uma experiência. Tudo tão calmo que parece que o universo está me observando de volta. Numa dessas manhãs, vi um arco-íris gigante e a sensação que eu tive é que ele foi só pra mim. Que só eu estava vendo aquilo. Eu acredito muito em Deus, sabe.

Essas escolhas que eu faço, sejam de trabalho ou mais pessoais, são sempre um tanto considerável mais complicadas do que o necessário. Quem, por exemplo, escolheria estar ao vivo todos os dias justo no último mês de um ano tão cansativo, sem poder falhar, sem poder perder a hora e sendo a única pessoa responsável por puxar um grupo todo? Eu né. A própria Sra. Grinch que não suporta a superficialidade de tanta gente agindo por osmose ao mesmo tempo. Ou eu fico na minha caverna com o Max contemplando o abismo ou saio pra fazer tudo ao meu alcance ser, no mínimo, diferente.

A live daquela terça era importante porque era a última sessão de mentoria do mês. Ao final de todas as semanas do projeto, eu separei um dia para conversar diretamente com algum aluno do English Grinchmas ao vivo. Além de ser uma oportunidade de rever os temas da semana, era também uma forma de direcionar e responder dúvidas mais pontuais de cada pessoa que participava. A treat, in my opinion. E a regra era simples: quem estivesse online e pedisse para entrar primeiro, entrava. Uma das alunas que mais havia se mostrado participativa ao longo do mês fez questão até de falar comigo alguns dias antes avisando que gostaria de participar e estaria a postos na hora. Não deu outra e, assim que abri a live, ela já estava online me dando bom dia.

Uma outra aluna porém, que não tinha participado tanto, foi mais rápida. Escreveu que só poderia ficar alguns minutos porque precisaria sair para trabalhar mas que gostaria de entrar ao vivo comigo e já mandou o pedido. Como eu sabia que a primeira estava antecipando aquele momento há alguns dias, estava online e pronta apesar de ter ficado com o segundo pedido por ordem na lista, perguntei se tudo bem e ela disse que “sim, claro!”.

Luana entrou com várias perguntas e queria uma dica sobre como incorporar, de um jeito sólido, pontos mais complexos de gramática no próprio repertório. Tudo normal, se não fosse a referência que ela escolheu: a Bíblia. Quando perguntei qual texto exatamente ela estava usando de base, ela me disse e eu li para todos em voz alta:

Dear friends, let us love one another, for love comes from God. Everyone who loves has been born of God and knows God. Whoever does not love does not know God, because God is love. This is how God showed his love among us: He sent his one and only Son into the world so that we might live through him.10 This is love: not that we loved God, but that he loved us and sent his Son as an atoning sacrifice for our sins. 11 Dear friends, since God so loved us, we also ought to love one another. 12 No one has ever seen God; but if we love one another, God lives in us and his love is made complete in us.

1 John 4

Fiquei emocionada na hora porque, como mencionei lá no começo, estou na minha própria jornada estudando e aprendendo sobre amor e essa coisa toda sobre completude faz tempo. Qual a chance de poder falar de gramática em inglês enquanto falo também sobre esse assunto tão pessoal pra mim? Inclusive, acho que se alguém me visse sem contexto naquele momento, pensaria que eu estava literalmente fazendo um culto ali em plena terça-feira às seis da madrugada. Ler e explicar gramaticalmente que houve um gesto de amor. Que todas as pessoas que existem e já existiram são parte disso. Que é amando e fazendo pelos outros que o amor de Deus fica completo dentro da gente. Que todas essas coisas, até na gramática, estão numa linha do tempo perfeita. Bizarro.

Mas fica mais bizarro.

Terminei as explicações, exemplos e dicas para essa primeira aluna o mais rápido que consegui enquanto driblava meus próprios sentimentos e, preocupada com a segunda, já quis liberar a live logo para que seguíssemos o plano. Travou.

Tipo, tudo. Travou tudo.

Pedi pra ela entrar e sair da live. Atualizar o app. Ela mandou o pedido. Eu mandei o pedido. Pedi pra outra pessoa entrar e testar. Entrar e sair mais uma vez. Fechei a transmissão e comecei outra. Nada mais deu certo. E aí essa minha segunda aluna parou de tentar e sumiu.

Quando eu finalmente desliguei tudo e fiquei em silêncio de novo, sem entender o que tinha acontecido, recebi uma ligação de um amigo que não costuma ligar. Alguns minutos depois e, de um jeito que eu nem sei racionalizar e desisti de tentar, acabei conversando com o colega de quarto desse meu amigo que estava, naquele exato momento, pensando sobre propósito e se as coisas são mesmo nossa escolha nessa vida ou se são pré-estabelecidas. Era um rapaz do Irã que foi chamado para falar sobre causas sociais numa igreja lá dos Estados Unidos. Ele não sabia se conseguiria passar credibilidade e não sabia se era algo que ele sequer deveria fazer numa igreja por não estar necessariamente em contato com Deus esses tempos.

Se eu estivesse em aula como tinha planejado, não teria tido a oportunidade de atender a ligação, ouvir esse rapaz e falar para ele que a experiência dele era exatamente o que as pessoas daquela igreja queriam ouvir. Que o fato dele estar pensando sobre propósito e querendo entender mais sobre o que Deus teria reservado para ele era exatamente o que Deus tinha para ele naquele momento. Que a gente estar tendo uma conversa que não tinha probabilidade nenhuma de acontecer não era coincidência, especialmente considerando o dia que eu estava tendo até então. Que mesmo que ele não estivesse próximo de Deus até ali, Deus tinha encontrado um jeito de se aproximar dele. E que seja lá o que fosse que ele achasse que precisava fazer, já estava fazendo.

Toda a energia que eu achei que eu já não teria mais àquela altura se multiplicou de uma tal maneira ao longo da conversa com esse rapaz que minha impressão era de que eu estava falando palavras que estavam saindo pela minha boca sem eu precisar raciociná-las. Eu sentia ondas de uma sensação que não me é estranha mas que eu reconheço justamente por ser rara. Sentia que tudo que eu havia vivido até aquele momento aconteceu do jeito exato que tinha acontecer para eu viver mais aquele dia e sentir mais aquelas coisas.

Algumas horas depois, recebi uma resposta da minha aluna que havia sumido pela manhã. Ela dizia que no meio de uma das nossas muitas tentativas frustradas mais cedo, uma amiga havia ligado para ela, do hospital, pedindo ajuda de emergência e ela teve que largar tudo imediatamente e ir. Disse que se tivesse participado da live não teria atendido a ligação e não teria conseguido ajudar a tempo. Disse que tudo que passava pela cabeça dela no caminho e a manteve calma para conseguir ajudar foi a passagem da Bíblia que eu havia lido para atender a primeira aluna.

Eu disse que ficava mais bizarro né. Avisei.

Na terapia, que “coincidentemente” deu certo naquela tarde, relatei todos os fatos enquanto o terapeuta me observava com atenção e, eu notei, com uma certa curiosidade também. Passei por tantos dias (e sessões) de obscuros vazios e desesperadora confusão que o contraste de perspectiva por si só já seria interessante, mesmo. Só eu, e talvez o terapeuta, sabemos o que significa, pra mim, poder finalizar esse ano sentindo alguma versão de paz. Dá vontade de chorar.

Eu termino esse texto sem ter uma lição ou ponto em específico para você que leu até aqui. Acho que fazer as coisas que a gente sente que precisa fazer é também, muitas vezes, o melhor que podemos fazer. É simples e ao mesmo tempo requer um nível deveras alto de atenção e sensibilidade porque perceber quais são essas coisas não é sempre um processo racional. É um negócio que requer amor. Amor pela gente mesmo, pelos outros, pela nossa vida em si. Então é amor o que eu desejo para você, pro mundo e pra mim. Amor pra usar seu cérebro, suas palavras e seus talentos. Amor pra fazer seu trabalho e amor tomar decisões difíceis. Amor pra perceber os detalhes que existem só para você ver. Amor pra se sentir completa(o) mesmo quando parece que só o que te falta é amor.

Bora em frente.

7 respostas para ‘Sobre amor, por hora

  1. Que texto profundo! haha Ler isso me faz acreditar ainda mais que coincidências não existem, a gente que às vezes não enxerga os fatos e o que aconteceu debaixo do nosso nariz. Desejo amor sempre, e acho que a cura do mundo vem dele; dele vem o respeito, o cuidado, a gentileza, a empatia. Feliz Natal e Ano Novo pra você, Cintia. Pro “mofilho” também. Saúde pra vocês!

  2. Caramba, Cintia!!! Esse texto me pegou de jeito… Principalmente, nessa parte: “Acho que fazer as coisas que a gente sente que precisa fazer é também, muitas vezes, o melhor que podemos fazer.” Também estou passando por tempos bem tensos, e ler suas palavras me deu um quentinho no coração. Muito obrigada!!

  3. Wow, esse texto inteiro é uma lição, me emocionei em vários trechos… é isso! Muito amor pra todos nós! Muito obrigada por esse texto! E que Deus te abençoe nesse Natal e sempre!

  4. Olá, Cintiq!

    espero que esteja melhor…
    feliz em ler seu texto, saber que Deus está presente em sua vida

    só Nele podemos encontrar o amor infinito e o alívio para uma dor tão grande quanto a da perda de um ente querido

    sempre torcendo por você
    abraço de um eterno fã
    – Procrast

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